19 de maio de 2009

A verdade da mentira


“Primeiro vieram os “yuppies” – “young urban professionals”; depois os “dinkies” –“double income no kids”; agora conheça os “lohas” – “lifestyles of health and sustainability”.

Os “lohas” compram café que obedece às regras do comércio justo e produtos orgânicos, frequentam mercados de produtores e aderem à medicina complementar, colocam as suas poupanças em fundos de investimento socialmente responsáveis e passam as suas férias como eco-turistas. Estão interessados na saúde, no ambiente, na justiça social, no desenvolvimento pessoal e num modo de vida sustentável.

[...] Juntos, os “lohas” norte-americanos representam 227 mil milhões de dólares, uma “imensa” oportunidade de negócio.” In “Guilt is no solution”, Financial Times, 16 Outubro de 2003

Um dia encontrei este texto, li-o e guardei-o. Tenho-o revisitado algumas vezes.

Gosto da forma como demonstra que conceitos como sustentabilidade, eficiência e o tão desejado lucro podem coabitar. Gosto da forma pragmática como aplica o pensamento económico à responsabilidade social e ambiental.

Na conjuntura global em que nos encontramos, sabemos que o lucro não vai ser colocado de parte, que não vai perder a sua condição “sine qua non”. No entanto, também estamos a ganhar consciência (às vezes da forma mais penosa) de que existem alterações que têm de ser implementadas nos moldes pelos quais nos regemos. E embora muitas vezes essas alterações não estejam associadas com o lucro, a verdade é que de uma forma um tanto ou quanto “verdade da mentira” se consegue estabelecer uma relação. Digo “verdade da mentira” porque o texto foca o valor monetário da oportunidade de negócio como motivação para as alterações, quando é no contrário que reside a verdade.

A empresa onde trabalho vende um produto verde, o chamado “Green IT”. É um servidor de comunicações que tem funcionalidades que permitem substituir até 7 dispositivos diferentes. O sucesso do mercado pode ser explicado por vários factores, mas gostava de salientar o facto de que, quem o detém não necessita de despender tanto dinheiro como se tivesse que adquirir esses 7 dispositivos, e que por outro lado vê a sua conta de energia reduzida em 70%. Além de existirem mais especificações que tornem proveitoso a obtenção deste produto, os dois que referi, por si só, fazem-no já apetecível. Não foi ao acaso que referi só vantagens do fórum financeiro, para muitos e, sobretudo para os mais ávidos de lucro, isso ainda contém um peso substancial nas suas decisões. Mas a verdade sobre este produto é que ele foi desenvolvido a pensar na sua componente ecológica, sustentável e eficiente.

Mais recentemente, num artigo do Jornal de Negócios encontrei o seguinte texto:

“Igualmente importantes são os estudos que presidem às apostas na criação de infra-estruturas nas áreas energéticas e ambientais. Um estudo de Setembro da Universidade do Massachussets, em Amherst, mostra que o sector tem um potencial enorme de criação de emprego.

Ademais, os chamados "green collar jobs" têm a vantagem de serem exigentes em capital humano, e por isso não passíveis de exportação para países de mão-de-obra barata.” In “E agora?” Carlos Ferreira dos Santos, Jornal de Negócios, 15 Janeiro 2009.

Penso que ele diz muito por si só e coloco-o aqui para colmatar a perspectiva macroeconómica que me podia faltar. Leva-me também a concluir que muitas das vezes não são as alterações em si que são difíceis de realizar, mas sim a maneira como são apresentadas a quem as pode efectuar...Se para implementar valores de sustentabilidade, eficiência e responsabilidade social numa sociedade (a que eu chamo verdade) for necessário recorrer ao lucro (a que eu chamo a mentira em termos de valores), então que se produzam muitas “verdades da mentira”...

Sem comentários: